Velas, Minas e Um Retrato…

  • 16
    Sábado
    Abril 2016
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    28
    Sábado
    Maio 2016
15.00 h

Pintura e desenho de Jorge Brandeiro (1927-2000), da coleção de arte da Câmara Municipal do Seixal.

De 16 de abril a 28 de maio
Horário

De terça-feira a sábado, das 15 às 19 horas.
 

JORGE BRANDEIRO
Lisboa, 1927-2000.

Em 1943, os seus desenhos começam a ser publicados, esporadicamente, em vários jornais, atividade que se torna regular a partir de 1945, tendo colaborado em dezenas de publicações e ilustrado diversos livros.
Expõe pintura desde 1947, na XI Exposição de Arte Moderna, Estúdio S.N.I., Lisboa; no I Salão Internacional de Aguarela Hispano-Português, Madrid e na Galeria Instanta, Lisboa.
Em 1963, integra o grupo do boletim Arte, da Sociedade Nacional de Belas Artes.
Em 1964, faz parte da direção da Sociedade Nacional de Belas Artes.
Pertenceu, até 1989, ao quadro técnico do Museu do Banco de Portugal.
 

JORGE BRANDEIRO: uma visão poética e crítica da sociedade dos nossos dias

O prazer estético tem que ser
um prazer inteligente.

José Ortega y Gasset

Gosto do risco e aversão à rotina; independência, por vezes a roçar a rebeldia, sensibilidade aguda aos condicionalismos sociais, ironia e profundidade humana; eis alguns traços da personalidade de Jorge Brandeiro que explicam, de algum modo, o seu percurso profissional e artístico.

Pintando desde os 12-13 anos, o adolescente observador e refletido cedo foi impressionado pela variedade de tipos humanos da Lisboa semiprovinciana dos anos 40. E começam, então, a definir-se as duas vias que (…) delimitam e caracterizam a atividade artística de Jorge Brandeiro: uma produção permanentemente satírica, de ilustrações, caricaturas, «cartoons» e banda desenhada (mais de dois mil desenhos entre 1944 e 1954), em numerosas publicações como o Sempre-Fixe, Os Ridículos, O Cara Alegre, entre outras; e a gradual construção de uma obra de pintor, que o levou a expor, pela primeira vez, com 20 anos, em 1947, na 11.ª Exposição de Arte Moderna, no 1.º Salão Internacional de Aguarela de Madrid, e na Galeria Instanta.

Substituindo o naturalismo dos ensaios da adolescência, já era, então, visível a tendência surrealista, que viria depois a afirmar-se, claramente, na sua primeira exposição individual, em 1953, na Sociedade Nacional de Belas Artes (óleo O Zero e o Infinito).

Com 29 anos, e uma vocação artística bem definida, Jorge Brandeiro aproveita a primeira oportunidade para alargar a sua experiência humana e libertar-se, por algum tempo, da mediocridade sufocante da sociedade portuguesa. Embarca na frota bacalhoeira: em 1956 está nos mares da Terra Nova, faz centenas de estudos sobre a vida dos pescadores, expõe no Canadá. Conhece Bernardo Santareno, que lhe pede colaboração para a cenografia da peça O Lugre, levada à cena no Teatro D. Maria II. Prosseguindo neste abrir de novas perspetivas sobre o homem e o mundo, visita em 1958 as Minas de Aljustrel e expõe, no ano seguinte, na Sociedade Nacional de Belas Artes, os seus trabalhos sobre a vida dos mineiros: são quase todos vendidos para Bruxelas. Mas a aventura continua: em 1966 viaja para a África do Sul, faz exposições em Pretória, na Cidade do Cabo, em Durban, em Pietermaritzburg. O seu trabalho é reconhecido pelo administrador do Transvaal como uma contribuição valiosa para a evocação simbólica dos Descobrimentos. Procura e encontra, em Durban, traços da passagem de Fernando Pessoa pela Durban High School, e lá deixa um retrato do poeta.

Foram dez anos de intensíssima atividade, de descobertas constantes, de riscos conscientemente assumidos.

Dez anos que enriqueceram temática e esteticamente a sua pintura. Ao surrealismo dos princípios dos anos 50, sucedeu o expressionismo dos trabalhos sobre os pescadores do bacalhau e os mineiros de Aljustrel. A temática alargou-se aos motivos sociais e marítimos que, por sua vez, evoluíram da representação concreta para um simbolismo poderosamente evocativo. (É o que se passa, por exemplo, com o tema das Velas, tão frequente na telas de Jorge Brandeiro que, para além da realidade objetiva, sugerem toda a insatisfação humana na busca do infinito e do absoluto). E, desde então, novos temas, novas técnicas, novas perspetivas, têm vindo a marcar a já vasta produção de um artista representado em mais de setenta exposições (individuais e coletivas), em pinturas murais de vários edifícios, e em museus e coleções particulares, em Portugal e no estrangeiro.

Visitante assíduo dos museus da Europa, estudioso da obra de grandes mestres, tendo acompanhado atentamente a prodigiosa evolução das correntes estéticas das últimas décadas, Jorge Brandeiro reconhece as influências que têm marcado a sua pintura, mas conserva uma independência crítica que lhe permite, por um lado, permanecer aberto à inovação e, por outro, rejeitar firmemente os excessos e as mistificações: «Vivemos numa época em que, por vezes, é difícil distinguir o pintor autêntico do simples troca-tintas», afirmava, já em 1960.

Acreditando que «Arte é comunicação de algo que os outros, por vezes, não captam e que a sensibilidade do artista concretiza na sua obra e lhes transmite em formas capazes de serem entendidas, embora, em muitos casos, essas formas sejam abstratas» (1981), Jorge Brandeiro nunca cede às tentações fáceis de um vanguardismo de ocasião. Há nele, antes, a exploração pessoal, equilibrada e flexível de tendências e de técnicas diversas. Impressionismo, surrealismo, expressionismo, arte abstrata e figurativa, sucedem-se e coexistem na sua pintura – às vezes na mesma tela. As inquietações do Homem de hoje e do Homem eterno, a problemática social e religiosa, o espetáculo de multidões angustiadas ou felizes (…), para além das paisagens, motivos marítimos e figura feminina, são as constantes de uma pintura, ao mesmo tempo subversiva e poética, de pincelada larga e cores fortes, que parece preferir os quadros de grandes dimensões, e que exprime, no essencial, uma permanente insatisfação e uma permanente contestação.

Após mais de 50 anos de atividade artística, parece oportuno citar uma afirmação sua, do início dos anos 80: «Em longos anos de atividade, já pintei centenas de quadros que estão espalhados pelas quatro partidas do mundo e creio que, até agora, ainda não consegui acabar nenhum».

Com o aparente paradoxo, Jorge Brandeiro recorda-nos, antes de mais, que a arte é uma experiência permanente, sempre viva e sempre nova. E também que, no seu caso, embora tenha, felizmente, concluído muitos quadros tem, sem dúvida, uma importante obra a prosseguir.

António Ribeiro dos Santos
(Excertos do texto do catálogo da exposição Jorge Brandeiro, Pintura, Galeria de Exposições do Fórum Cultural do Seixal, 5 de novembro a 13 de dezembro de 1994).

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